Liberdade, Liberdade

Liberdade, Liberdade!

(por Roberto Sabbadini)

Será que, realmente, almejamos liberdade em nossas vidas? Voamos em suas asas através dos relacionamentos interpessoais e com a natureza? Ou exigimos dos demais que correspondam aos padrões engendrados em nossas expectativas? Vivemos conforme o nosso querer mais sadio, ou procuramos ainda corresponder aos ditames da sociedade, principalmente dos mais próximos? Eis as questões de caráter essencial que precisamos analisar.

Vivemos num mundo em que os contrastes são necessários para a devida compreensão das dicotomias existentes no orbe. É assim que encontramos a escravidão como uma nódoa em nossa caminhada rumo ao Cristo, em contraste determinante à liberdade com a qual fomos criados. Tomemos em seus caminhos infelizes o exemplo para podermos reajustar nossas consciências frente às leis eternas, sem as agruras e absurdidades que a falta de liberdade impõe.

Símbolo da evolução de um povo, a liberdade que se configura no respeito ao semelhante, sem ferir os seus direitos naturais, há que ser exercitada em cada atitude cotidiana. Sejamos o reflexo da divindade em favor da coletividade, compreendendo e defendendo os que ainda permanecem escravizados emocionalmente e espiritualmente sob o poder da força.

Quando Jesus afirmou que era necessário o escândalo, não configurava em suas palavras o horror que um processo de tolhimento da liberdade, através da força indecorosa de um povo sobre o outro, em cativeiros horrendos e indecentes à vida humana digna, fosse um dia realidade na Pátria do Evangelho. Carregamos coletivamente essa mancha infeliz e imprópria que tempo levaremos para reequilibrar na igualdade indefectível que existe entre todas as almas.

Através da oportunidade de uma nova vida em padrões de fraternidade universal, possamos romper as algemas de qualquer tipo de sectarismo, racismo e preconceito, unamo-nos na defesa que carece perseverança para virar realidade no país em que vivemos. Façamos nós a diferença no seio de uma sociedade ainda tão necessitada de respeito e integridade aos diferentes. “E que a voz da igualdade seja sempre a nossa voz”.

A partir do momento que renegamos a igualdade de direitos e a diversidade que existe nas escolhas de cada qual, trabalhamos imprevidentemente na perpetuação das forças que confrangem a alma a uma vida de opressão constante. E, assim, impedimos o exercício do que é mais sagrado na lei eterna, a livre escolha de como se viver. A liberdade foi-nos outorgada por Deus e ninguém tem o direito de tolhê-la sem grandes consequências infelizes. O amor é livre e ninguém que se diga amante dele pode reprimi-lo em suas manifestações diversificadas. Reter é perecer.

Liberdade, palavra utópica para muitos, enquanto não se renovam internamente e terceirizam a grande propriedade de escolher como, de que forma, em que padrões e a maneira conveniente que me apraz viver. Da escravidão ultrajante de corpos físicos às algemas energéticas que alimentamos pela ignorância das leis imperecíveis, sejamos a diferença na sociedade em que nascemos. Até a liberdade de não ser livre é posicionamento individual e inalienável de cada um.

Intimamente já nos consideramos livres do mal que nos prejudica? Dos maus hábitos que nos amarram os caminhos para a felicidade? Da inveja que perde o foco da própria vontade para difamar o semelhante? Do conformismo que corrompe a força de vontade e o esforço da conquista? Da procrastinação que falseia a fé de que algum espírito há de fazer por nós o que compete única e exclusivamente a cada um?

E a partir de nossas atitudes pessoais sejamos instrumentos de liberdade daqueles que convivem conosco. Em cada gesto, pensamento e na convivência social, tenhamos na liberdade o respeito ao direito inalienável de cada um ser da maneira que melhor lhe aprouver. Somente a vida em abundância poderá nos propiciar as mais belas horas que poderemos desfrutar no cotidiano.

Creio, sinceramente, que enquanto houver um Homem escravo na vida, eu jamais serei plenamente realizado no trabalho de implementação do Reino de Deus em meu coração. Busco abandonar a ilusão que em adquirindo um estado de felicidade, ele automaticamente será compartilhado com o outro, sem que para isso demande esforço e perseverança na sua aquisição. Assumo a responsabilidade de fazer a minha parte no importante concerto divino da igualdade que antecipa a comunhão fraterna entre povos e nações.

O amor deve ser a bandeira que unirá num mesmo ambiente, apesar das diferenças inerentes a cada um, todas as almas dispostas ao convívio fraterno com respeito e hombridade. Faça morada em nossos corações a partir do singelo ato de caridade ao que sofre, muitas vezes sem saber que está preso nas amarras emocionais de um falso amor, porquanto somente na tranquilidade do ambiente e na pacificação das almas desafiadoras é que defrontaremos níveis mais sutis de prazer.

Liberdade é o reconhecimento da existência do outro; da necessidade de convivência num mesmo plano de ação; do respeito ao direito do semelhante em se manifestar nos padrões por ele escolhido; que o julgamento é uma reprimenda ao direito inalienável de outro de ser e viver conforme desejar; é não se incomodar com pensamentos discrepantes e, até algumas vezes, antagônicos aos nossos; enfim, é o exercício contínuo de enxergar nos outros os mesmos direitos que os nossos.

A mentalidade de não exigir perfeição completa nos estágios que nos encontramos é uma forma de liberdade, pois se torna mais leve o correr das horas, tiramos um peso desnecessário à ansiedade da transformação simplista numa natureza que tem o seu próprio ritmo, aliás “debaixo do céu há um tempo para tudo”, já nos advertiu o livro Eclesiastes do Velho Testamento.

Ser livre é não requerer de maneira intempestiva que as horas se sucedam como escravas a nos propiciar os deleites de um mundo ilusório sem esforços ingentes na sua conquista. É permitir dançar e ser conduzido pela natureza ao influxo da presença do amor em voluteios harmônicos configurados na partitura divina, regidas por mãos invisíveis, para a fruição do êxtase que nos é ofertado a cada música tocada pelos devas* da beleza e da arte.

*devas: são seres celestiais, deuses que regem a Natureza no Hinduísmo. O nome deriva da raiz sânscrita div, que significa resplandescente, brilhante. Como adjetivo significa algo divino, celeste, luminoso.

829. Há homens naturalmente destinados a ser propriedade de outros homens?

      — Toda sujeição absoluta de um homem a outro é contrária à lei de Deus. 

A escravidão é um abuso da força c desaparecerá com o progresso, como pouco a pouco desaparecerão todos os abusos.

833. Há no homem qualquer coisa que escape a todo o constrangimento,e pela qual ele goze de uma liberdade absoluta?

      —É pelo pensamento que o homem goza de uma liberdade sem limites, porque o pensamento não conhece entraves. 

Pode-se impedir a sua manifestação, mas não aniquilá-lo (O Livro dos Espíritos, Allan Kardec).

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