D.Yvonne Pereira, mediunidade a serviço da vida

 

“— Creio que nasci médium já desenvolvido, pois jamais me dei ao trabalho de procurar desenvolver faculdades medianímicas.”[1]  Com frases contundentes, transparentes e até certo ponto incômodas como essa foi que dona Yvonne se colocou nos debates doutrinários durante toda a sua vida. Uma médium de fibra, à frente de seu tempo, arrojada, firme e disciplinada, além de possuir uma sensibilidade mediúnica que a caracterizou pela potencialidade e fecundidade nos diversos trabalhos que realizou durante 84 anos incompletos que esteve nesta reencarnação.

Com 29 dias de nascida já apresentou manifestações ligadas ao seu último suicídio em encarnação anterior, através do processo chamado catalepsia/letargia, não identificável pelos médicos de seu tempo o que a levou a ser dada como morta, tendo sua certidão de óbito lavrada. Com a persistência e fé de sua mãe, ela voltou à vida e simbolicamente foi entregue nos braços de Maria, mãe de Jesus, a responsável pelos trabalhos fecundos de socorro aos suicidas no plano espiritual. A partir daí sua relação com os espíritos se intensificou e permaneceu acompanhando sua vida 24 horas por dia, em sonhos e em desdobramentos que renderam livros que nos encantam até hoje.

Aos quatro anos já se comunicava com os espíritos naturalmente em seu lar, em especial com dois espíritos, um que fora seu pai na última reencarnação e exercia a tarefa de conduzi-la pelos caminhos evangélicos autotransformadores, imprescindíveis para o seu reequilíbrio psíquico-mental-emocional, chamado Charles. O outro foi seu marido, amigo, inimigo e primo, dentre outras personalidades, e que também lhe auxiliaria em suas tarefas mediúnicas, inclusive através do receituário homeopático, pois exercera a medicina em encarnação pregressa.

Aos oito anos de idade se repetiu o fenômeno de desprendimento parcial chamado de ‘morte aparente’ e que a partir dos 16 anos não a abandonou mais, sendo manifestação perispirítica intensa que lhe propiciou o reencontro com diversos espíritos. Um deles o conhecido e famoso escritor russo Leon Tolstoi, que pela psicografia deixou seus registros e ensinamentos no encantador ‘Ressurreição e Vida’ além de participação em dois contos no livro ‘Sublimação’.

Dos quatorze aos quinze anos foi inúmeras vezes desprendida do corpo pelo espírito Roberto, seu ex-marido em vidas passadas, e através de excursões reveladoras e encantadoras no plano espiritual, em estado de transe cataléptico parcial, vislumbrou cenários e atividades de suas vidas anteriores. Essas seriam rascunhadas pelo próprio Roberto, mas que em função do planejamento reencarnatório abandonou o projeto que foi reestabelecido, revisado e reescrito pela alma orientadora e paternal de Charles. A trilogia de sua vida pode ser compulsada nos títulos, ‘Nas Voragens do Pecado’, ‘O Cavaleiro de Numers’ e ‘O Drama da Bretanha’.

Outro espírito que foi suporte e amparo durante sua estadia entre nós foi o inolvidável médico dos pobres, Dr. Adolfo Bezerra de Menezes. Sempre presente tutelando sua tarefa mediúnica e aconselhando seus passos no desempenho ativo delas, soube temperar o amor e a disciplina com a influência direta em seu psiquismo. Também utilizou a mediunidade psicográfica semi-mecânica de sua pupila para deixar seus apontamentos lúcidos em livros como ‘Dramas da Obsessão’ e “Tragédia de Santa Maria’, com participação expressiva no ‘Nas Telas do Infinito’.

Vemos como D. Yvonne deixou uma vasta obra de livros psicografados, que são um manancial importante para estudo e desenvolvimento das potencialidades mediúnicas, como também de exemplos evangélicos consistentes e capazes de tocar as fibras íntimas de nossas almas. Faz-se mister lembrar que foi a primeira médium a escrever de próprio punho livros autobiográficos com relatos de suas experiência mediúnicas, perfazendo um conjunto inesgotável de ensinamentos preciosos aos amantes e lidadores do fenômeno mediúnico. São eles ‘Devassando o Invisível’ e ‘Recordações da Mediunidade’.

Filtrou com maestria o livro que é considerado um dos maiores tratados da revelação espiritual a nós reencarnados, delineando meandros inimagináveis e impactantes da realidade dos irmãos suicidas pós tentativa de violar a lei maior de Deus, extinguir-se da vida. Levou mais de trinta anos para que viesse a público, foi escrito por Camilo Castelo Branco e revisado pelo companheiro de Kardec, Léon Denis. É um livro que precisa ser estudado, explorado, divulgado e incorporado definitivamente em nossas mentes como roteiro, amparo e prevenção contra esse mal que assola a humanidade; o suicídio.

Destaca-se que sua mediunidade profícua e diversa em suas manifestações ajudou inúmeros espíritos, encarnados e desencarnados, aliviou consciências e trouxe à luz vários cegos do espírito, abriu caminhos para a compreensão do plano espiritual, consolou, enxugou lágrimas, levantou caídos e confortou corações. A par de sua vida exemplar, demonstrou de maneira contundente a possibilidade de um espírito suicida e devedor da lei divina reerguer-se através dos esforços ingentes e disciplina austera, trabalho evangélico a partir de seu próprio coração, respeito ao semelhante e incentivo constante ao progresso individual.

Não foi uma vida fácil, leve, isenta de problemas, dificuldades e desafios emocionais exorbitantes. Foi uma mulher que soube aproveitar as oportunidades encontrando no exercício da mediunidade o caminho para a redenção de sua alma. Entretanto deixou registrado que “efetivamente, grandes provações e testemunhos, lágrimas ininterruptas, sem me permitirem um único dia de alegria neste mundo,”[2]. Àquele que persevera no esforço de esquecer de si em prol da felicidade coletiva, sendo instrumento do bem e do amor aonde a vida os convidar, estará alistado como obreiro de Jesus e amparado pelos bons espíritos que precisam de braços humanos para elevar a humanidade a um estágio de paz e fraternidade universais.

Deixou como incentivo ao que chora e sofre neste mundo de desterro, que já sentiu o desespero com vontade de abandonar a vida, angustiado e incompreendido diante dos desafios terrenos, mas que encontrou no espiritismo um ambiente confortador e esclarecedor da importância do esforço pessoal e intransferível na renovação íntima: “— Obrigada, meu Deus, pela bênção da mediunidade que me concedeste como ensejo para a reabilitação do meu Espírito culpado.”

[1 e 2] Recordações da Mediunidade, Yvonne Pereira.

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